terça-feira, 29 de junho de 2010

Zoo Party


A ressaca é interminável, a cama continua laranja e me chama como um penhasco que suga, prometendo um vôo sem volta, sem despedidas. O corpo que emoldura o existente provisório necessita e é necessitado.


O saber liberta, mas também corroe, dilacera os românticos, os alegres! O saber, inevitavelmente nos distancia do cotidiano, do convencional. Todos os corpos que até então eram desenhados pela visão, e entendidos pelos sentidos, começam a se abrir em milhões de outros corpos, e a conclusão, ou melhor, o entendimento da vida, vai ficando cada vez mais distante, pois da mais ínfima partícula pode-se perceber outras milhões de partículas.

O que nos resta? Como disse Rilke, “Resta-nos, quem sabe, a árvore de alguma colina, que podemos rever cada dia; resta-nos a rua de ontem e o apego de algum hábito cotidiano que se afeiçoou a nós e permaneceu. E a noite, a noite, quando o vento pleno dos espaços do mundo desgasta-nos a face, a quem se furtaria ela, a desejada, ternamente enganosa, sobressalto para o coração solitário? Será mais leve para os que se amam? Ai, apenas ocultam eles, um ao outro, seu destino. Não o sabias? Arroja o vácuo aprisionado em teus braços para os espaços que respiramos, talvez os pássaros sentirão o ar mais dilatado, num vôo mais comovido.”

E perdemos ou nos perdemos, em falsas valorações, que não podem trazer nada de bom ao espírito, não alimenta, muito menos sacia. E a cobra rasteira corre atrás do próprio rabo infinitamente, pensa que um dia será feliz e bela como as mariposas que são leves e plenas.

Vivemos numa época voraz, voltamos à barbárie, se é que um dia saímos dela. Revolução tecnológica, robótica, revolução dos sentidos, da falta de sentidos. A caça interminável de recompensas, caça capitalista e carnal, caça do gozo. Revolução da vontade, do insaciável.

Será essa a definição contemporânea? Será que os nossos sucessores terão essa visão de nós? Do nosso tempo, esse tempo que é bordado pelo fio fino e tênue de material humano que compõe um novelo inexplicável, intangível.

E a musica não pára, a ópera de bufões continua, o grande circo com seus palhaços e domadores fazem o grande espetáculo tragicômico da “realidade” almejada. Vamos à festa, viver o momento, morrer na intensidade máxima da paixão, sentir e sentir, não importa o preço, sentir e sentir, pois não se encontra paz no simples, no singelo, não existe mais encantamento.

A real grandeza clama por seus súditos, por seu rebanho, a fauna é grande, o zoológico é pequeno. Quem vai pagar esse pato?

terça-feira, 8 de junho de 2010

Plantando idéias.


Falar sobre o fugidio e indecifrável “Eu” é quase ou totalmente impossível. Já que o intelecto vaidoso forja muitas realidades. Rimbaud já dizia “Eu é um outro”.


Façamos o seguinte, vou tentar falar do que me é apresentado todos os dias, um “eu” que parece ser conhecido meu. Se não corresponder à realidade é porque talvez eu esteja mentindo ou quem estiver ouvindo esse texto não me conheça como eu me conheço.
Ou o sistema humano é uma máquina muito controversa, cheia de meandros, com possibilidades múltiplas de entendimento.


Acredito na ultima hipótese. Somos pessoas passiveis de transformação o tempo todo.
Em constante troca de pele. Quem não troca, morre, vira parasita.

Dentro de todos esses estudos e pesquisas antropológicas e filosóficas e lendo muito tudo isso que é produzido todos os dias e também o que já foi falado pelos antigos gregos, pelos românticos alemães e pela sabedoria clássica francesa, me vejo como um transporte, como algo que transporta um verbo ou um texto, sim, somos palavras, signos, códigos, matemática, somos atores...

Não poderia me concluir numa imagem, não sei dizer o que sinto muito menos o que sou. Como disse, “sou palavra”, e o que está por trás da palavra é simplesmente tentativa de compreensão.

Portanto prefiro não tentar uma arriscada explicação do meu “Eu”. O que posso dizer é que sou esse estranho que busca uma arte, que busca uma ilha para fincar os pés, para plantar um pé de alface ou plantar uma idéia no ar. Sou volição, sou tentativa...